A fotografia é frequentemente conceituada como um meio para "congelar" momentos no tempo — uma captura estática que serve como registro imutável de um instante particular. Essa noção, embora romântica, negligencia a riqueza e a complexidade inerentes à própria natureza da fotografia. Quando vemos uma fotografia apenas como um fragmento do tempo cristalizado, limitamos nossa compreensão desse poderoso meio de expressão, reduzindo-o a uma mera imobilização do fluxo incessante da vida.
Longe de ser um simples "congelamento" de um momento, a fotografia é um organismo em constante mutação. Poderíamos até pensar em uma imagem fotográfica como um "palimpsesto" emocional: um antigo manuscrito que foi apagado e reescrito várias vezes, mas onde os rastros de suas versões anteriores ainda são visíveis e adicionam profundidade e complexidade ao todo.
Folhear um álbum de família antigo é mais do que um passeio de nostalgia. É um convite para revisitar e reinterpretar cada imagem à luz das nossas experiências acumuladas. A foto de um aniversário infantil ganha novos contornos quando vista pelos olhos de um adulto, e a fotografia de um ente querido que se foi assume outros significados à medida que o luto dá lugar à aceitação e à saudade.
A revolução digital trouxe à fotografia um paradoxo intrigante. Enquanto as fotos agora têm o potencial de ser instantaneamente compartilhadas e vistas por uma audiência global, essa onipresença digital também coloca em questão a sua durabilidade. Nas redes sociais, uma fotografia pode conquistar centenas ou até milhares de olhares em questão de segundos, mas essa mesma visibilidade não garante sua sobrevivência no turbilhão de conteúdo que flui constantemente pela internet.
Ela pode ser imediatamente "curtida", compartilhada e então rapidamente esquecida, perdendo-se na cascata de informações que é nossa vida digital. A foto se torna tanto imortal quanto efêmera: imortal porque, teoricamente, uma cópia digital pode durar indefinidamente; efêmera porque sua relevância pode ser tão curta quanto o ciclo de vida de um 'trending topic' nas redes sociais.
Da mesma forma, se as fotografias impressas enfrentam o desbotamento das cores e o desgaste físico — testemunhando os processos de desgaste e deterioração a que estão sujeitas — as imagens digitais também têm suas próprias formas de "envelhecimento". Estão sujeitas à obsolescência tecnológica; pense em quantas imagens foram perdidas devido à mudança de formatos de arquivo ou armazenamentos em mídias agora consideradas arcaicas, como disquetes ou CDs.
Assim, seja no papel ou em pixels, a fotografia continua a ser um organismo em evolução, afetado tanto por forças externas como pelo contexto em que são revisitadas. O ato de fotografar, portanto, é mais do que uma captura estática do tempo: é uma inserção de um momento em uma narrativa maior, fluida e mutante, que inclui não apenas o sujeito e o fotógrafo, mas também os espectadores futuros e os contextos nos quais a fotografia irá existir.
E quanto à forma como interpretamos as fotos? Poderíamos compará-las ao palco de um teatro, onde a mesma cena pode ser encenada de inúmeras maneiras, dependendo do diretor, dos atores e, claro, da plateia. Em uma foto de um pai segurando seu pequeno filho, vemos então um testemunho da conexão humana em sua forma mais pura. Essa imagem sugere um diálogo mudo, cheio de significados, entre duas gerações. Mas com o tempo, o mesmo quadro pode revelar outros matizes de sentido, talvez mostrando não só a ternura, mas as complexidades e até inseguranças inerentes às relações familiares. Cada nova interação com essa imagem permite novas leituras, ressignificações e emoções.
Então, encaremos a fotografia não como um artefato imutável, mas como um campo dinâmico e sempre em transformação. É esta capacidade de se reinventar continuamente, de se adaptar e evoluir em conjunto com nossas próprias vidas e interpretações, que faz da fotografia um meio tão poderoso e tão humano.
Escrito por Angela Rosana, saiba mais sobre mim aqui.
Os créditos aos fotógrafos constam nas imagens, com links para os respectivos perfis no Instagram. Conheça mais o trabalho de cada um!
Se você gostou desse artigo, deixe sua avaliação ao final da página!
Leia outros artigos aqui
Visite nosso Instagram
Publicação no Instagram @vivaoclique_ em setembro de 2023
A fotografia merece ser descrita de forma poética e profunda assim como escreveu. Uma vez li que a fotografia não pode ser somente sempre descrita em palavras, mas por si só, ao ver uma foto, ela já diz muito. A fotografia pode ser também a representação daquilo que não pode ser dito, mas ao olhar, é como se sentisse em casa, ou fazer sentir saudades, até dor, mas somente com uma imagem, nossos "divertidamentes" entram em caos. Obrigada pela oportunidade de mostrar meu trabalho aqui, é uma honra estar compartilhando o espaço com tantos outros artistas.