Fiat Fluxus (?)
- Angela Rosana
- 26 de abr.
- 2 min de leitura
Atualizado: 8 de jul.
E se o que chamamos de acaso fosse apenas a forma mais crível do que não entendemos? Há lampejos que irrompem de uma falha no tempo, um breve esquecimento da ordem, quando a realidade se dobra sobre si mesma e algo emerge, quase imperceptível, carregado de uma densidade antiga. Às vezes, confundimos essas irrupções com erros, com irrelevâncias, como se a vida só pudesse caber nas formas previsíveis que aprendemos a nomear. No entanto, é nesses espaços — nesses descompassos sutis, nessas brincadeiras impróprias com o sentido — que se escondem as forças mais subversivas da criação. E talvez seja preciso reaprender a ver, a mover-se no fluxo, a escutar o que nunca pediu para ser dito, para então reconhecer o que, de tão livre, quase passa despercebido.
Tudo o que escapa carrega um rumor de início. Não exige olhos atentos: exige olhos disponíveis. Quando a matéria fraqueja e o tempo se desfaz em silêncio, algo, sem pressa, acontece. Não é preciso nomear. Não é preciso entender. Algumas coisas só se tornam visíveis quando desistimos de persegui-las. Talvez a realidade, em seus momentos mais exatos, prefira o que se desfaz ao que se fixa, o que se insinua ao que se impõe.

Há presenças que se recusam a ser contidas. Existem em estado de quase, de quase ser, de quase dizer. Às vezes, tudo o que se pode fazer diante delas é simplesmente permanecer. Foi esse impulso — ou essa recusa de fixar — que moveu artistas como os do Movimento Fluxus, nos anos 60. Não lhes interessava a obra acabada, mas o movimento que escorria entre as mãos, o instante em que o sentido se desfazia antes mesmo de se firmar. Interrupções quase imperceptíveis: um rasgo na ordem habitual das coisas, uma instrução inútil deixada no meio da rua, um objeto esquecido onde não devia estar. Não se tratava de construir algo novo, mas de enfraquecer o que parecia definitivo. Apenas a fissura mínima por onde outra realidade começava a respirar. Um copo vazio esquecido na mesa. Uma folha levada pelo vento.
Há uma beleza particular nas coisas que se recusam a ser inteiras. No que vacila. No que se fragmenta antes de se afirmar. Talvez porque a vida também se componha assim: não de certezas, mas de aproximações. Não de verdades fixas, mas de desvios que contornam o que não se deixa tocar. Há quem insista em capturar, em nomear, em fixar. Mas há também quem prefira o contrário: deixar escapar. Não definir, mas abrir espaço para o que ainda não é. E talvez seja aí — nesse quase nada que insiste — que algo realmente aconteça.
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Linda fotografia da Margot Costa!